Foco de atenção do mundo todo, o desmatamento das florestas da Amazônia é um dos agentes responsáveis pelas grandes mudanças da paisagem da região. Segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), até o fim da II Guerra Mundial, a presença humana no meio ambiente quase não trouxe modificações à cobertura vegetal natural da Amazônia. Um novo período foi iniciado, contudo, com as políticas – principalmente no Brasil – visando a expansão das fronteiras agrícolas e o assentamento de imigrantes, oriundos de regiões densamente povoadas e/ou carentes.
Atualmente, diversas pesquisas vêm sendo desenvolvidas com o objetivo de analisar os impactos que a ação humana vem causando no funcionamento e na biodiversidade dessas florestas. As atividades agropecuária e madeireira, realizadas principalmente nos últimos trinta anos, são responsáveis por grande parte dos desmatamentos ocorridos nessas florestas. De acordo com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), já foram devastados cerca de 550 mil quilômetros quadrados da floresta amazônica brasileira, o que equivale a 13,7% da mata. Desse total, 200 mil quilômetros foram abandonados pelos exploradores assim que os recursos naturais se esgotaram. Esses locais abandonados são conhecidos como capoeiras e possuem grande quantidade de espécies de trepadeiras e lianas, que não proliferam na mata primária (vegetação original). Uma capoeira é muito mais difícil de ser preparada para o plantio do que a mata primária. Apesar do crescimento da agricultura predatória na Amazônia, uma pesquisa recentemente elaborada pelo Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), em parceria com o Banco Mundial, concluiu que, além dos solos pobres, 83% da região amazônica recebe chuva em excesso para que a agropecuária tradicional seja rentável. (Relatório: “Manejo Florestal Sustentável, Mudanças Econômicas no Uso do Solo e Implicações para Políticas Públicas na Amazônia”, segundo Folha de S. Paulo, 22 de outubro de 2000). As queimadas fazem parte do processo de transformação das florestas em roças e pastagens. O fogo é o instrumento utilizado pelos fazendeiros para limpar o terreno e prepará-lo para a atividade agropecuária ou para controlar o desenvolvimento de plantas invasoras. Na maior parte dos casos, elas são realizadas no final da estação seca, quando é obtido o maior volume de cinzas e quando a vegetação está mais vulnerável ao fogo. Apesar de barato, esse processo traz inúmeros impactos ambientais, principalmente ao fugir do controle, atingindo áreas que não se desejava queimar. O livro A floresta em chamas: origens, impactos e prevenção de fogo na Amazônia ( D. C. Nepstad et al) apresenta um estudo sobre os três principais tipos de queimadas que ocorrem na Amazônia. Um deles refere-se às “queimadas para desmatamento”, que são intencionais e estão associadas à derrubada e à queima da floresta. O outro tipo são os “incêndios florestais rasteiros”, provenientes de queimadas que escapam ao controle e invadem florestas primárias ou previamente exploradas para madeira. Há ainda as “queimadas e os incêndios em áreas já desmatadas”, resultantes do fogo intencional ou acidental em pastagens, lavouras e capoeiras. Num primeiro momento, as queimadas podem funcionar como fertilizantes do solo, uma vez que as cinzas produzidas são convertidas em nutrientes vegetais pelos microorganismos da terra. No entanto, a queima sucessiva de uma mesma região pode matar esses mesmos microorganismos, tornando o solo cada vez mais empobrecido e impróprio para a agricultura. Esse procedimento traz ainda conseqüências no clima e no ciclo das águas. Os pastos e as lavouras absorvem menos energia solar do que a vegetação original e podem contribuir para uma redução de chuvas e um aumento na temperatura da região Amazônica. (Nepstad et al, 1999). As queimadas são ainda responsáveis pela emissão significativa de gases que causam o efeito estufa, como o gás carbônico (CO2). Por outro lado, as plantas retiram esse gás da atmosfera, utilizando-o para seu crescimento. O problema é que, atualmente, as queimadas produzem muito mais gás carbônico do que as plantas podem absorver. Pesquisas recentes indicam que uma floresta queimada, tem probabilidade muito maior de pegar fogo novamente. A segunda queimada é sempre mais intensa e a mortalidade das árvores é muito maior. O fogo que queima pela segunda vez é alimentado pela material seco resultante da primeira queimada. Este fogo é aproximadamente duas vezes mais alto, duas vezes mais largo e mais vulnerável a novos incêndios. Outro grande impacto das queimadas nas florestas é o da extinção de espécies nativas, com grandes prejuízos à biodiversidade. Garimpo e extração mineral na Amazônia Além de todos os impactos e agressões ao ambiente causados pelas atividades ligadas à agropecuária e à exploração madeireira, o extrativismo mineral também representa uma fonte de degradação ambiental. Atualmente, na Amazônia, existem cerca de 20 regiões de alta concentração de garimpos de ouro. São famosas as histórias do Projeto Carajás e do Projeto Jari nas décadas de 70 e 80. A Amazônia possui ainda uma série de riquezas minerais mal exploradas economicamente. Metais como ferro, zinco, alumínio, nióbio e ouro estão presentes no subsolo amazônico em quantidades variáveis. A maior mina de nióbio do planeta está em São Gabriel da Cachoeira, estado do Amazonas. Em Nova Olinda, também no Amazonas, há uma reserva de Cloreto de Potássio (KCl, importante fertilizante de solos) estimada em 340 milhões de toneladas, que até o começo da década de 90 estava sendo estudada pela Petromisa, com colaboração do Serviço Geológico do Brasil (CPRM). O governo Collor extinguiu a Petromisa, deixando esta importante reserva abandonada. Cabe salientar que os custos que o Brasil tem com a importação de fertilizantes agrícolas só são superados pelos custos de compra de petróleo. Porém, é no garimpo de ouro aluvial na Amazônia que toda a sorte de conflitos econômicos e sociais se manifestam. O Brasil não possui uma política mineral explícita, sendo a exploração do ouro organizada regionalmente, pelas populações locais, movidas por aspirações de ascenção e fuga da eterna exclusão social. Freqüentemente os garimpos funcionam com infra-estrutura precária, agredindo o ambiente e liberando grandes quantidades de mercúrio nos rios, no ar e no solo. Um estudo de autoria de Oswaldo Bezerra, Adalberto Veríssimo e Christopher Uhl, publicado na revista Natural Resources Forum, volume 20, estima que na bacia do Rio Tapajós, no oeste do Pará, são liberadas, anualmente, cerca de 12 toneladas de mercúrio no ambiente. Nesta região existiam, no começo da década de 1990, cerca de 245 garimpos empregando diretamente 30 mil pessoas. A maioria dos garimpeiros que atuam diretamente na coleta de ouro são trabalhadores braçais, com baixo grau de escolaridade. O trabalho no garimpo é extremamente desgastante fisica e emocionalmente: não há nenhuma assistência médica, a exposição aos agentes na natureza é constante e há o risco de desabamento de barrancos. Violência e dependência de drogas são ocorrências comuns neste trabalho. Ao passo em que os comerciantes de ouro, que compram o produto do garimpo, e os “donos de garimpo” são mais abastados, vivendo do usufruto da riqueza produzida no local. Estes donos e empresários investem o dinheiro conseguido em terras (principalmente na pecuária) na região e no mercado financeiro. Os garimpeiros gastam seu dinheiro com os produtos mínimos para subsistência, bebidas alcólicas e outros bens de consumo adquiridos no próprio local. Freqüentemente em outros países, a riqueza produzida na mineração é usada para investimento no desenvolvimento local, com o auxílio do Estado. O garimpo de ouro na Amazônia não se enquadra nesta regra: é uma atividade nômade. As áreas de garimpo são exauridas e as populações movem-se para a próxima área, deixando um rastro de empobrecimento ambiental e social, assoreamento dos rios e contaminação por mercúrio. O uso de mercúrio nos garimpos O mercúrio é usado como auxílio na purificação do ouro, pelo processo conhecido como “amalgamação“. Este metal adere ao ouro metálico formando o amálgama. Posteriormente, o amálgama é aquecido e o mercúrio é vaporizado, restando o ouro puro. Duas formas químicas do mercúrio são as mais comuns: o metilmercúrio (MeHg), uma forma “orgânica” e o mercúrio metálico, facilmente vaporizável. Esta forma de garimpo de ouro é extremamente poluidora, uma vez que o mercúrio se acumula no ambiente sob diversas formas. O metilmercúrio acumula-se facilmente em peixes e outros animais silvestres. No homem é absorvido por via digestiva, provocando uma intoxicação crônica com complicações renais e nervosas. O mercúrio metálico é absorvido por via respiratória quando vaporiza-se, na purificação do ouro. Provoca, além dos mesmos problemas renais e nervosos, intoxicações pulmonares. O metilmercúrio concentra-se ao longo da cadeia trófica, apresentando-se nos peixes em quantidades muito maiores do que no ambiente. Desta forma, o consumo de peixes, em áreas de garimpo, representa um perigo para homens e principalmente, para mulheres gestantes. Fetos podem sofrer teratogênese (mal-formações) e deficiências de desenvolvimento nervoso e motor, quando as mães alimentam-se destes peixes. Apesar de todas as contra-indicações e efeitos lesivos do uso de mercúrio nos garimpos, a pressão da necessidade econômica ainda dita o avanço desta atividade. Os garimpos produzem a subsistência de grupos humanos em condições precárias, em meio a toda sorte de doenças como malária, leishmaniose, doenças sexualmente transmissíveis, hanseníase e os males produzidos pelo mercúrio. Após o esgotamento do aluvião, os garimpeiros movem-se para o próximo ponto de trabalho, tão empobrecidos quanto sempre estiveram. Só quem lucra neste sistema são os donos de garimpo, mas a riqueza não fica na região, e nem serve ao desenvolvimento. Vai embora junto com os homens. |
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