A Amazônia é perigosa para os jornalistas

Dois anos após o brutal assassinato de Dom Phillips e Bruno Pereira, a floresta amazônica continua a ser um lugar extremamente perigoso para os jornalistas. Embora a morte dos dois ativistas tenha levado as autoridades locais a adotar novas medidas, o problema parece ainda estar longe de ser resolvido. Descreve a situação atual o último relatório da organização brasileira sem fins lucrativos, Instituto Vladimir Herzog (Ivh). O documento, publicado a 19 de junho, descreve todos os episódios de violência contra jornalistas ocorridos na floresta amazônica de 2013 a 2023.

Durante estes dez anos, ocorreram 230 agressões, nas quais nove jornalistas foram mortos. Destes episódios, 89 ocorreram no norte do Estado do Pará. Devido às agressões e aos atos de intimidação, muitos jornalistas também se veem obrigados a abandonar a floresta ou a mudar de domicílio várias vezes ao longo do ano. O documento é muito explícito identificando a causa principal das agressões com as atividades mineiras, madeireiras e pecuárias que se praticam ilegalmente na floresta. “O governo brasileiro deve tomar medidas imediatas para garantir a segurança dos jornalistas e dos seus colaboradores”, afirma a jornalista Sonia Bridi na declaração final do relatório.

Durante o governo de Bolsonaro, no cargo de 2019 a 2023, o desmatamento da floresta amazônica atingiu níveis sem precedentes, facilitado por uma desregulamentação geral do setor e pelas repetidas restrições impostas pelo governo central ao trabalho de órgãos como a Fundação nacional para a tutela dos povos indígenas (Funai). Ao mesmo tempo, a floresta amazônica tem sido objeto de uma cobertura mediática crescente e de numerosas campanhas de sensibilização em relação à sua importância para a luta contra o aquecimento global. Estes dois fatores contribuíram para delinear um cenário em que a floresta é povoada por um número crescente tanto de jornalistas, como de garimpeiros e caçadores ilegais, geralmente propensos à violência contra qualquer pessoa que possa interferir nas suas atividades. Não é por acaso que 45 agressões a jornalistas tenham ocorrido entre 2021 e 2022. Os numerosos episódios de violência atingiram duramente a liberdade de imprensa no país: sob Bolsonaro, o Brasil caiu abaixo do 100º lugar no World Press Freedom Index, ranking global elaborado anualmente por Repórteres sem fronteiras (Rsf). Desde a reeleição de Luiz Inácio Lula da Silva, a situação melhora gradualmente, com o país que subiu para a posição n. 82 em 2024.

Outro aspeto problemático é a lentidão dos processos judiciais: o julgamento dos autores do assassinato de Phillips e Pereira já foi adiado duas vezes e, até agora, ainda não tem uma data marcada. Também aguarda justiça o repórter Roman dos Anjos, que foi raptado enquanto investigava o garimpo ilegal em Roraima em 2020 e depois abandonado quase morto na floresta pelos seus raptores.

No entanto, estas adversidades não têm impedido iniciativas jornalísticas relevantes na região: alguns exemplos são o projeto “Amazon Underworld”, um banco de dados sobre as atividades e movimentos ilegais de grupos armados em toda a Amazônia, gerida por um coletivo transnacional de 37 jornalistas, e a investigação sobre a prática conhecida como “reciclagem de gado” (o movimento contínuo de gado entre diferentes pastagens ilegais, de modo a dificultar a sua localização) feita pelo brasileiro Marcel Gomes, vencedor do Prémio Goldman para o meio ambiente em 2024.

GIOVANNI BENEDETTI

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